Era de prever: com
o aproximar das eleições autárquicas, o recém-criado movimento UPOB (Unidos Por
Oliveira do Bairro) teria o seu baptismo de fogo. Os movimentos de cidadãos –
ora encabeçados por independentes, ora por quem já teve uma filiação partidária
– têm muito a ver com a insatisfação contra o funcionamento dos partidos
políticos e os seus processos de escolha de candidatos. Por isso, há cada vez
mais cidadãos que à revelia dos partidos se organizam para resolver os
problemas das suas comunidades. Ao fazê-lo, alargam o espectro da participação
política sem que tenham de se submeter às trocas de favores e às intrigas em
que se atolam muitas estruturas locais dos partidos tradicionais.
As listas sem
patrocínio partidário não agradam, é bom de ver, aos que tudo têm feito para
enquadrar e até monopolizar os direitos dos cidadãos. O atrevimento dos que deixam
o casulo partidário e abandonam a sua zona de conforto teria que esbarrar nos
que sempre olharam, com desconfiança, para qualquer proposta de refrescamento
da vida autárquica. A esses convém dizer que se não há democracia sem partidos,
a democracia também não se esgota neles.
E como em
Oliveira do Bairro também os lobos uivam, o UPOB já teve o seu baptismo de
fogo. Na edição de 23 de Março passado, o Jornal
da Bairrada inseriu um texto assinado por Pedro Fontes da Costa, com o
seguinte título: “Candidato da UPOB à Câmara de Oliveira do Bairro plagia Plano
Estratégico do Sabugal 2025”. Assim mesmo, falando de plágio de uma forma peremptória.
Só que, logo no primeiro parágrafo, o citado jornalista troca o assertivo
“plagia” pela expressão mais evasiva “terá plagiado”.
Em que ficamos?
Quando num título de jornal se diz, sem evasivas, que há plágio e logo a seguir
se fala em eventual plágio, estão a colocar-se em causa valores básicos do
jornalismo como a procura da objectividade e a busca da isenção. Se o título de
um texto não bate certo com o corpo da notícia, é comum dizer-se que estamos a
vender gato por lebre. É o que acontece quando o rótulo de um vinho não
corresponde ao conteúdo da garrafa: estamos a defraudar as expectativas do
cliente.
Mais do que uma
opinião, ou uma metáfora, o rótulo de plágio que Pedro Fontes da Costa colou ao
candidato Fernando Silva é uma acusação (não esqueceu, sequer, a moldura
penal...) que deve ser comprovada. Ou se prova a acusação – com consequências
para o visado – ou o rótulo é difamatório e tem consequências para o autor da
notícia. A quem acusa incumbe o ónus da prova. Se o não fizer, então o
texto do Jornal da Bairrada não terá
passado de pólvora seca: fez estrondo, mas talvez poucos estragos na imagem do
candidato. Ou há prova, ou tudo não terá passado da construção de um insulto
que a alguém aproveita.
Para que não
subsistam quaisquer dúvidas, quero desde já acrescentar que o texto de Pedro
Fontes da Costa tem pelo menos um mérito: o de nos dar a conhecer que o artigo
de opinião assinado por Fernando Silva, na edição de 9 de Fevereiro do mesmo
jornal, não é da sua autoria. E isso não soubemos, na altura. Bastaria uma
simples alusão ao Plano Estratégico do Sabugal para tudo ser diferente. Para
não sermos, enquanto destinatários da sua mensagem, induzidos em erro ou
enredados nos problemas da verdade ou da falsidade dos discursos produzidos.
Dito isto, vale
a pena acrescentar que a facilidade com que hoje se acede aos bens culturais
disponibilizados em rede levanta problemas sérios quando falamos de utilização
ilícita. Como os coloca, também, quando estamos em presença de noções como
“direito de autor”, “propriedade intelectual” ou “plágio”. Quando uma pessoa
copia outra sem citar as fontes, para haver plágio é preciso provar que essa
outra pessoa também não se inspirou em ninguém. Dito de outro modo: que o que
essa pessoa escreveu ou disse é cultura em primeiro grau e não, como acontece
com as anedotas, tabaco já mascado por muitas bocas.
Ora, no caso em
análise, podemos ler na própria notícia do Jornal
da Bairrada que Victor Cardial chama a si a propriedade intelectual do
documento, quando afirma: “Fui eu que escrevi o que está no Plano Estratégico
do Sabugal e dei autorização ao Eng.º Fernando Silva para publicar. E fui eu
que lhe pedi para não colocar o meu nome no artigo de opinião que foi colocado
no jornal”. E quando se diz que que o artigo de opinião de Fernando Silva
reproduz “de forma quase integral” (sublinho o quase) duas páginas do Plano
Estratégico do Sabugal, está-se a reconhecer que o texto “apresenta alguns
elementos de inovação”. Ora a inovação, acrescentada ao documento inicial,
também fragiliza a noção de plágio.
Para se poder
falar de roubo intelectual são precisas três coisas: um objecto roubado, um
ladrão e uma vítima. No caso em apreço quem é a vítima? Quem se queixou?
Ninguém. O detentor da propriedade intelectual do documento apenas se
justificou. Nem sequer exigiu ver o seu nome tornado público. Em vez disso,
limitou-se a autorizar a utilização da sua obra.
Como era de
esperar, nada disto foi suficiente para abafar as acusações de plágio. O que veio
à tona, não só no Jornal da Bairrada,
foi um indisfarçável azedume contra o novo movimento cívico. Ninguém se
preocupou em saber se o Plano Estratégico do Sabugal está a ser bem aplicado,
se está a ter sucesso, ou se pode representar uma mais-valia para o concelho de
Oliveira do Bairro. Discutir ideias dá trabalho e só discute ideias quem as tem.
Mais importante, para alguns, é tentar fragilizar os adversários políticos.
Pouco importa se um artigo de jornal não é propriamente um trabalho académico
ou se o Jornal da Bairrada está longe
de poder ser considerado uma revista científica. Falta a citação, a nota de
rodapé... e pronto!
Além das ideias
que perfilha para o concelho, um candidato a Presidente da Câmara não está
impedido de importar ou imitar modelos que no plano material ou estético
enriqueçam as suas propostas. Se muitos autarcas viajassem e conhecessem o que
se faz por essa Europa fora, não teríamos certamente que contemplar os
mamarrachos que por aí abundam em praças, rotundas e jardins públicos. Quando
as BUGA (bicicletas de utilização gratuita) apareceram em Aveiro – certamente
inspiradas na Holanda, na Bélgica ou noutro país qualquer – o Presidente da
Câmara incorreu em plágio por não citar a fonte da sua inspiração?
Enfim, como o
discurso político é um dos que maior carga de contrabando de sentidos pode
gerar, é legitimo que os eleitores locais se interroguem se alianças como a do UPOB
significam amor verdadeiro aos interesses do concelho ou tão só a salvaguarda
de interesses particulares. Se são ouro de lei ou apenas reflectem o brilho de
falsos ouropéis. O certo é que estas candidaturas assustam, a avaliar pelos
resultados de 2013.
Vai ser um ano
escaldante – antecipava um dia destes a directora do Jornal da Bairrada. Pois vai. Oxalá que o aproximar das eleições
autárquicas não nos devolva as cenas menos edificantes registadas há uns bons
quinze anos na Assembleia Municipal do nosso concelho. Numa delas, um ilustre
representante do poder local “teve que ser agarrado e aconselhado pelos colegas
a sair da sala para que os ânimos arrefecessem um bocado. Uma verdadeira sessão
de pancadaria esteve mesmo iminente” – pode ler-se na edição do Jornal da Bairrada de 2 de Dezembro de
2004. Talvez o UPOB ajude a refrescar as estruturas partidárias locais e a
arejar um pouco mais a casa da democracia do concelho.
Até lá, convém
estarmos atentos. Como acontece com Uma
Campanha Alegre, de Eça de Queirós, nada nos garante que não vá ser preciso
derrubar, uma ou outra vez, a “tolice de cabeça de touro”.