terça-feira, 26 de maio de 2009

Votar ou não votar nas europeias


Para responder de modo afirmativo à questão é necessário pressupor a boa-fé dos políticos. E isto que parece óbvio deixa de o ser se levarmos a sério a desconfiança que quotidianamente manifestamos e o descrédito a que a classe política chegou. E, contudo, sem essa confiança básica de que o político eleito servirá o Bem Comum que sentido faz votar? Um voto que se baseasse apenas no dever cívico de votar, no hábito ou na fidelidade acrítica a uma cor partidária, sem pressupor que o político está lá para servir, seria como passar um cheque em branco - quem nos garantiria que o receptor não é criminoso? É certo que todo o voto acarreta risco, mas, em princípio, o conhecimento prévio do candidato dá algumas garantias. Mas mesmo que as não tenha em absoluto e já não acredite no sistema partidário, talvez o eleitor vote porque acredita, apesar de tudo, no regime democrático. Ora, isto conduzir-nos-ia a uma pergunta lancinante: poderemos confiar no regime democrático sem confiar nos políticos que nos representam?

Se vamos votar, acreditamos portanto nos políticos. Mas - e quando são os próprios políticos que alinham no discurso da desconfiança em relação aos políticos e à política? Pois não diz um cartaz - o do CDS/PP: «Não andamos a brincar aos políticos»? Ora, segundo esse cartaz, podem eles não andar: mas alguém anda! E não diz outro cartaz - o do PSD: «As famílias portuguesas acima das famílias partidárias»? Mas então há quem faça o contrário: pois se esse é o traço distintivo desse partido, se essa é uma razão válida para que o escolhamos... Escolhi os cartazes destes partidos; podia ter escolhido o de outros e ter feito reflexões semelhantes. O dilema resolve-se, no entanto, se acreditarmos pelo menos na bondade das intenções dos políticos em quem votamos.

Mas ainda que creiamos na bondade das intenções destes ou daqueles políticos, estas eleições são para a Europa e portanto é legítimo perguntar qual o verdadeiro poder político dos nossos deputados mo Parlamento Europeu? Podem ir, de facto, contra a sua família política na Europa e conseguir alguma coisa? Alguém acredita que as boas intenções conseguem enguiçar a máquina diabólica em funcionamento dos países mais poderosos? Pode-se alegar que, acoplada à rectidão das intenções vem a capacidade negocial, a estratégia (casamento estranho, convenhamos…). O deputado português poderia, então, vender a alma ao Diabo, mas conseguiria, no fim, «o menos mau dos resultados». «Em nome do interesse nacional», garante Paulo Rangel que assina por baixo. E se nenhum dos papéis que lhe for parar às mãos for do interesse nacional? Assinará? E a sua família política, assinará? Poderá fazer propostas, o deputado, é certo. E se a sua proposta for chumbada?... É caso para perguntar: para quando uma política diferente da propaganda e da querela? Do outro lado do atlântico parece que alguém se decidiu a mudar alguma coisa, por cá parece que os políticos ainda não aprenderam…

Resumindo: votar hoje é mais do que nunca um acto de fé. Fé na lei das probabilidades, mais do que nos políticos, talvez. E não votar ou votar nulo? Seria esse gesto lido e reconhecido como um voto de protesto? Um aviso aos políticos de que deverão mudar profundamente a sua atitude e as suas práticas?

Paulo Carvalho

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