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domingo, 15 de março de 2009
Pela Dignidade na Migração e na Vida
A comunidade imigrante manifestou-se hoje em Lisboa contra a desigualdade de direitos entre cidadãos estrangeiros e nacionais e para exigir documentos que permitam aos imigrantes trabalhar de "forma legal e digna". (in Público)
Estou ciente de que é tabu ou fracturante em Portugal - por falta ou por extrapolação da informação, medo irracional, e/ou unilateralidade na visão, entre outros motivos - o tema da Imigração. Reformulo a frase, para ampliar a questão: estou ciente de que o tema da fracção é, mais do que o do trânsito e da fixação, o da assimilação da diferença e da bilateralidade.
Há exercícios simples, mas sensatos, que evitam ou já evitaram ou aliviaram muita tensão em que nos envolvemos ou a que assistimos: 1) colocarmo-nos no lugar do outro, 2) olharmo-nos ao espelho (não só ao estilo de Narciso), 3) argumentarmos, sem medo da impopularidade junto dos interlocutores, quando julgamos, mal ou bem, ouvir injustiças, mitos, simplificação ou parcialidade, e 4) partir para o diálogo, para o conhecimento real do «outro», que pode estar muito distante da imagem do «diz-que-diz-que» ou do estereótipo perpetuado sem questionamento (Nota: Estas sugestões foram tudo menos criadas por mim... No entanto, dirigem-se a mim também. Não há imunidade humana à irracionalidade, ao impulso, ao erro, feliz ou infelizmente).
Porém, opto agora pela via das perguntas e da exposição de algumas visões sobre Portugal e a sua relação com o exterior e o seu histórico de migrações e «mestiçagem».
Portugal, um país historicamente marcado pela viagem, pelo risco, pela diáspora - alguma ilegal e sofrida, que tocou inclusive conterrâneos (quantos palhacenses? quantos destinos?) - e pelos cruzamentos étnicos e culturais, simultaneamente xenófobo?
Poder-se-á dizer que a xenofobia (que «abarca» muitas fobias) - medo obscurantista e irracional do estrangeiro, do corpo estranho, da diferença (ou de nós próprios?) - é cultural e, por isso compreensível, mas também é culturalmente portuguesa a história dos intercâmbios, de partidas. Afinal, onde ficamos e para onde vamos (por falar em migrações)?
Provavelmente vários países navegarão, durante mais alguns séculos, entre estes dois pólos, estes dois portos... Entretanto, pelo e a caminho, cruzar-se-ão com clandestinos, precários, em cima de lanchas ou embarcações de resistência duvidosa, ou em terra, em busca de uma vida melhor (afinal, não é isso que todos desejamos?). Uns morrem no e a caminho; outros sobreviverão, fortes ou enfraquecidos. Em «terra», as oportunidades dependerão de quem está ou não para os acolher, lhes dar oportunidades.
Por nos situarmos em território da civilidade, não quero deixar passar em branco esta corajosa manifestação de cidadania, em Lisboa, contra o pré-juízo e o prejuízo, o preconceito (mal) disfarçado (o «eu até tenho um amigo que...»), o racismo, a tacanhez proteccionista, a sombra e a perversão da clandestinidade, o tráfico humano de seres desprotegidos, os abusos laborais e a burocrática odisseia (nos SEF e não só) em busca dos direitos civis, e a favor de um Simplex na legalização dos imigrantes (descansem, os alarmistas: a legalização implica direitos, mas também deveres), da diversidade, intercâmbio e consequente enriquecimento cultural e, acima de tudo, da dignidade humana, num mundo irreversivelmente globalizado (para o bem e para o mal).
Em jeito de conclusão sobre o tema, deixo uma questão e uma tentativa de resposta:
Se um imigrante, cidadão honesto, for bem sucedido (melhor do que eu) em Portugal, porque não ficarei eu satisfeito? Que relevância terá a sua proveniência, ou terão os prefixos?
A Justiça - nos vários sentidos do termo, mesmo que humana e defeituosa, por isso - terá que ser patriótica, proteccionista? Não, pelo contrário. Acho que este cidadão deverá ter todos os direitos e deveres que eu, nascido aqui, possuo. Penso em hipóteses, em cenário de instabilidades e de hipotecas de futuro, em Portugal: Um dia poderei ter eu, e muitos jovens sem perspectivas (em sectores do mercado de trabalho esgotados), que emigrar e espero esperança (passe o pleonasmo). Penso ainda que nasci em Portugal, sem ter pedido: Poderia ter nascido, sem querer, num Portugal salazarista, na China, no Zimbabué ou em Angola - não menosprezando as virtudes que estes países também têm (as que já conhecemos, e provavelmente as que o poder, as manipulações mediáticas e a distância física podem aniquilar ou ofuscar) - e ser vítima dos excessos das guerras militares e de privilegiados umbiguistas, de uma ditadura, de delito de opinião, da fome, da cleptocracia ou de uma qualquer repressão maquiavélica, medieval, inumana.
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